Dendrofobia

 

Dendrofobia 

Medrava no quintal da minha vizinha um imponente e lindíssimo cedro. Fora plantado em 1982, por ocasião de uma campanha de reflorestação de terrenos de pinhais ardidos, cujas novas árvores, doadas pelo Governo, ficaram conhecidas por “pinheiros do Balsemão”, alusão à iniciativa do primeiro-ministro de então.

Por várias vezes a vizinha exprimiu vontade de abater aquela árvore com receio de que ela viesse a cair, causando estragos na vizinhança, eventualidade pouco provável já que o pinheiro, como ela lhe chamava, tinha um aspeto bastante saudável e estava bem enraizado, considerando o tipo de terreno em que se encontrava implantado. Sempre que ela aludia à sua intenção e eu lhe pedia que não cortasse a bonita árvore, ficava muito admirada porque, na opinião dela, os vizinhos nunca gostam de árvores nos quintais ao lado, por lhes fazerem sombra e sugarem os nutrientes do solo. Não era o caso e nunca acreditei que o abate se viesse a concretizar.

Um dia destes, manhã bem cedo, ouvi o roncar de motosserras no quintal da vizinha. Fiquei alarmado e fui de imediato ver o que se passava. Lá estavam dois carrascos empoleirados no magnífico cedro, num frenesim diabólico, a derrubar pernadas e ramos e a preparar o corte do eixo central.

Interroguei o filho da vizinha, que assistia imperturbável ao medonho espetáculo. Insensível, respondeu, laconicamente, que era esse o desejo da mãe.

Impotente, depois de manifestar o meu grande desgosto por tal ação, regressei a casa.

Ao fim da tarde, no amplo relvado do jardim, que mais parecia um teatro de operações de uma terrível batalha campal, jaziam os restos do que tinha sido um maravilhoso ser vivo. Como se isto não bastasse, fui dar com os obreiros e vizinhos a piquenicar em alegre contubérnio, como que a festejar o acontecimento.

 É pena que a paisagem tenha sido mutilada desta forma infame.

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