As tabernas de outros tempos
As tabernas de outros tempos
Em meados do século passado as
tabernas proliferavam em Oleiros, dando à vila um certo colorido e animação.
Eram pontos de encontro e de convívio, locais onde os homens passavam os seus
momentos de lazer num tempo em que ainda não havia televisão nem polos de
atração, culturais ou recreativos ou, pelo menos, os que existiam eram
incipientes.
Tudo era pretexto para ir à
taberna beber um copo. Convidavam-se os amigos e não se recusava a companhia de
quem estivesse por perto. Beberricava-se ou bebia-se o copo de uma assentada
para, desse modo, afirmar uma certa personalidade que, neste caso, era sinónimo
de valentia. Para situações de maior privacidade havia quase sempre um
compartimento mais recatado e discreto, o “escondidinho”. A “cova funda” era
também um local reservado e só a ele tinham acesso os mais próximos do
taberneiro. Em geral, era neste espaço que se guardavam as pipas de maior
envergadura e era delas que se tirava o vinho diretamente para os copos. Não
raro, a “cova funda” prestava-se à preparação de petiscos, nem sempre
acessíveis aos normais clientes da taberna.
As tabernas encontravam-se quase todas no centro da vila mas também as havia nas suas imediações. A rua do Cimo da Vila, hoje com escassa população, era a que apresentava o maior número destes estabelecimentos. Era a do Isidro, a do Armando Ventura, a do Zé Caldeira, a do Alfredo Buraca, a do Teotónio do Milrico e a do Arsénio. Mais tarde juntou-se a do José Perlegas. Havia ainda a do Rufino, mas esta tendia já para café. Na Praça, além do Café Alvelos havia a taberna da Celeste e a do Afonso. Já na rua de Baixo encontrava-se a do Zé do Café e a do Amândio Guerra. Mais abaixo, na rua Dr. José de Carvalho, situava-se a do João Rei, a do Zé Francisco, a do Augusto da Rita, a do João da Rita e a da Carolina Teodora. Ali perto encontrava-se a do Joaquim da Rita, a do David Parente e, já na Devesa, a do Augusto Esteves. Fora do centro, mas ainda dentro da vila, estava a do Francisco Salgueiro, a do José Henriques, a do João Latrâmbias e a da Amélia Pinheira (mais tarde do Marcelino). Na periferia da vila situava-se a da Eugénia Pavoa, nos Cancinos, a da Maria Lopes, na Cova dos Pinheiros, e a do David Mendes, na Horta da Santa. Esta última não passava de um barracão coberto com chapas de zinco. Incluindo cafés, existiam, pois, 29 estabelecimentos comerciais onde se podia beber vinho. A abundância de tabernas em Oleiros não é um fenómeno recente, pois já o bispo de Angra, nas suas “Memórias de Oleiros”, obra publicada em 1881, referia a existência de “cerca de trinta tabernas na vila”.
O vinho era servido em copos de
três tamanhos diferentes: o “copo” com cerca de 10 cl, o “copo-de-três”, assim
chamado por 3 unidades perfazerem meio litro e a “selha” que correspondia a 25
cl. Naturalmente, para além de vinho e bebidas espirituosas, serviam-se outras
bebidas não alcoólicas, tais como pirolitos, groselhas e capilés.
Com tal abundância destes
estabelecimentos era de esperar que se verificassem exageros no consumo de
bebidas alcoólicas. Havia mesmo bêbados crónicos, bem conhecidos de toda a
população, que se apresentavam num estado de euforia grotesca, ao longo de
quase todo o dia. Aos domingos, depois da missa do meio-dia, juntava-se ao
pessoal bebedor local alguma população do termo. Em resultado de tal
contubérnio e bulício a vila era palco de ruidoso entusiasmo e era comum chamar
a este momento do fim do dia o “domingo à tarde”, expressão carregada de
sentido pejorativo.
Para rentabilizar o espaço da
taberna alguns proprietários utilizavam o local para outras atividades
comerciais, desde a carpintaria à venda de quinquilharias de barro. Neste caso,
o teto do estabelecimento servia de mostruário para cântaros, bruxas e
quejandos. De todos estes expedientes comerciais o mais bizarro era talvez o
mister de sapateiro. E não eram poucos os taberneiros que, no espaço da
taberna, se dedicavam ao conserto de calçado, atividade pouco condizente com o
ato de servir copos de vinho. Estranho era também o ofício de barbeiro que se
desenvolvia em pararalelo numa delas.
Uma particularidade daqueles espaços era o tipo de portas que davam acesso à rua. Estas basculavam para dentro e para fora, por ação de um sistema de dobradiças, quando eram transpostas pelos clientes. Ao mesmo tempo, o sistema mantinha o espaço interno vedado aos olhares indiscretos de quem passava na rua. As abas basculantes das portas ficavam bastante afastadas do chão, por onde podia passar um cão, e o bordo superior era suficientemente baixo para, em bicos de pés, se poder dar uma espreitadela para o interior. Aparentemente tratava-se de uma imposição legal para que o espaço não fosse devassado a partir do exterior. Até parecia que algo de proibitivo se passava lá dentro!
As tabernas não se extinguiram
por completo, mas as poucas que restam já não têm o pitoresco colorido do
passado.
Sim agora li isto tudo com mais atenção e acho que isto é muito importante para a Vila de Oleiros! Obrigada pela partilha. Laurinda.
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